Dei por mim na Mercadona a olhar para um produto que me fez lembrar o futebol em Portugal. No corredor dos cosméticos há lá um produto denominado Sérum Flash cujo propósito é dar um efeito tensor de algumas horas ao rosto. Não é uma novidade e recordou-me uma conversa tida noutra vida quando trabalhava em farmácia. Uma cliente, amiga dos ambientes noturnos, comprava dessas pequenas ampolas com frequência. Audaz, um dia perguntei se aquilo fazia mesmo efeito. Ela, já bem dentro da 2ª metade da vida responde sem hesitar “Filho, à noite e com o barulho das luzes faz maravilhas. O pior é na manhã seguinte…”
O futebol em Portugal é como esta senhora. Vive muito de aparências. À primeira vista é fácil ser seduzido pela qualidade de alguns jogadores, pelas cifras milionárias que os principais clubes apresentam em vendas de jogadores. Convenhamos que a Liga tem feito um excelente trabalho de apresentação da proposta comercial do futebol nacional. A visibilidade granjeada tem trazido investidores estrangeiros, mas que de certo se sentirão defraudados quando “acordam de manhã.” É que quando tem de se olhar diariamente para a realidade sem filtros, esta custa mais a encarar.
Faltam muitas coisas. Falta público nos estádios, faltam adeptos a muitos clubes, faltam condições em muitos recintos, tanto para quem vai ao futebol, como para quem o consome em casa.
É inconcebível estar cinco minutos a aguardar por uma decisão do VAR numa situação de fora-de-jogo porque a câmara destinada a esse efeito só consegue estar posicionada num local que não permite uma leitura imediata e simples do lance. Mas , principalmente, falta futebol de qualidade. O jogo de futebol em Portugal é em 99% dos casos, muito aborrecido. E como entretenimento que é, se a pessoa não gosta, não consome. E é aqui, na parte do apelo ao consumo, que a mentalidade tem de mudar.
Quem joga são os jogadores, quem os orienta é o treinador, mas quem lhes paga o ordenado é quem tem o maior poder sobre a forma como uma equipa aborda os jogos. É incrível ver como algumas equipas se transformam totalmente quando defrontam adversários de maior valia. Um treinador que na maioria das jornadas é elogiado pelo futebol que a sua equipa pratica, nesses ditos jogos parece sofrer uma lobotomia. E o pior, é que o resultado final acaba por ser quase sempre o mesmo. Assim sendo, o treinador muda porque quer realmente mudar, ou porque se sente pressionado a isso por quem está acima dele? A mentalidade vigente em Portugal é jogar para não perder e isso torna o jogo extremamente chato. Não há uma verdadeira vontade de se promover o produto futebol, só a de proteger a todo o custo o investimento feito. E muitas vezes, mal feito. Projetos estruturados e pensados são uma miragem no deserto.
É difícil vender um produto que não é apelativo a todas as horas do dia. Pode-se camuflar com poções milagrosas, com operações de charme, com toda a maquilhagem que se quiser. Mas no final do dia, o que conta é a qualidade do conteúdo e não da embalagem.
É por isso que não penso que a centralização dos direitos seja realmente o remédio para grande parte das maleitas do nosso futebol. Os clubes grandes não irão querer receber menos do que já recebem o que, à partida, está garantido. O grande problema centra-se em como gerar interesse nos potenciais compradores, para que o valor recebido pelas outras equipas seja realmente potenciador de uma maior competitividade.
Perguntem a um profissional de futebol que se dedique a observar o jogo se o prefere fazer na Bélgica, ou em Portugal e a resposta dele será clara e reveladora.